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Eduardo Nagai
Contos, crônicas e poesias de um professor surtado.
Textos

O MEDALHÃO ANCESTRAL

 

O sol dourado se derramava sobre a paisagem, iluminando cada canto daquele remoto vilarejo. As montanhas, ao longo, pintavam o horizonte com sombras azuladas, enquanto uma leve brisa acariciava os campos verdes que se estendiam até onde a vista alcançava. No centro dessa tela natural, um líder nato de barba grisalha e olhos profundos caminhava lentamente em direção a um antigo campo, seguido por seu neto, um garoto de olhos divertidos e curiosos.

 

O avô, conhecido por todos como Joaquim, era um homem de poucas palavras, mas de olhar que carregava séculos de histórias não contadas. O neto, Pedro, era o oposto: cheio de energia e questionamentos, sempre ávido por descobrir os segredos que o mundo guardava. Chegando ao campo, Joaquim parou diante de uma árvore centenária, cuja copa se estendia majestosa sobre o solo fértil.

 

— Este lugar tem uma história — disse o avô, quebrando o silêncio que geralmente os acompanhava.

 

Pedro olhou para o avô com surpresa; não era comum Joaquim iniciar conversas.

 

— Que história, vovô? — disse o garoto, com os olhos brilhando de expectativa.

 

Joaquim suspirou, como se ponderasse se deveria ou não revelar o que sabia.

 

— Há muito tempo, antes mesmo de eu nascer, nestes campos, residiu uma família que desapareceu misteriosamente.

 

Pedro arregalou os olhos.

 

— Desapareceu? Como assim?

 

O avô continua:

 

— Ninguém sabe ao certo. Alguns dizem que foram levados pela floresta, outros acreditam que encontraram algo que não deveriam.

 

Enquanto o vovô conversava, Pedro sentiu um arrepio percorrendo sua espinha. O vento parecia sussurrar entre as folhas da árvore, como se confirmasse a história de Joaquim.

 

— E o que eles poderiam ter encontrado? — perguntou o garoto, sua curiosidade agora atiçada.

 

Joaquim olhou para o horizonte, como se buscasse respostas nas montanhas distantes.

 

— Há quem diga que há algo enterrado neste solo. Algo antigo, poderoso.

 

Pedro franziu a testa.

 

— Um tesouro?

 

O avô sorriu levemente.

 

— Talvez. Ou talvez seja melhor não sabermos.

 

Nos dias que se seguiram, Pedro não conseguiu tirar a história da cabeça. Cada vez que acompanhava o avô ao campo, sentia que o lugar escondia mais do que aparentava. Decidiu que ele iria descobrir o que estava enterrado ali.

 

Uma tarde, enquanto vasculhava o sótão da casa do avô, Pedro encontrou um velho diário. As páginas amareladas e a capa desgastada indicavam que era muito antiga. Na primeira página havia um nome: “Antônio”.

 

— Quem será? — indagou Pedro ao seu próprio pensamento.

 

Começou a folhear o diário, lendo fragmentos de textos que falavam sobre rituais, símbolos e um medalhão.

 

Intrigado, Pedro levou o diário para o quarto e passou a noite lendo suas páginas. Descobriu que Antônio era um ancestral da família, que vivia no mesmo vilarejo séculos atrás. O diário detalhava como havia encontrado um medalhão que concedia desejos, mas que trazia consigo uma maldição.

 

Antônio descrevia como o medalhão corrompia a alma de quem o possuía, levando-o à loucura e à perdição. As últimas páginas eram confusas, com escritos desconexos e desenhos de símbolos estranhos.

 

No dia seguinte, Pedro confrontou o avô.

 

— Vovô, quem era Antônio?

 

Joaquim ficou pálido ao ouvir o nome.

 

— Onde você encontrou esse nome? — Disse, com a voz tensa.

 

Pedro mostrou o diário.

 

— Encontrei isto no sótão. Por que você nunca me contou sobre ele?

 

Joaquim suspirou profundamente.

 

— Antônio foi um homem que se perdeu nas sombras do poder. Nossa família decidiu que seu nome não deveria ser considerado, para que seus erros não se repetissem.

 

Pedro sentiu uma mistura de medo e fascínio.

 

— Mas o que aconteceu com ele?

 

— Ele encontrou algo que não deveria ter sido encontrado. Algo que corrompeu sua alma e trouxe desgraça para nossa família. É por isso que devemos deixar o passado onde está, Pedro — disse o avô, com um olhar severo.

 

Mas uma curiosidade de Pedro já havia sido despertada. Naquela noite, ele voltou ao campo, levando consigo o diário de Antônio. Decidiu que encontraria o medalhão e o usaria para ajudar sua família, que passava por dificuldades financeiras.

 

Seguindo as instruções do diário, Pedro caminhou até uma formação rochosa próxima ao campo. Lá, encontrou uma entrada oculta, que levou a uma caverna subterrânea. As paredes eram cobertas por símbolos semelhantes ao diário.

 

No centro da caverna havia um pedestal de pedra, onde estava relatado o medalhão descrito por Antônio. A pedra vermelha no centro emitia um brilho pulsante. Ao se aproximar, Pedro sentiu uma energia intensa ao seu redor.

 

— É real — sussurrou.

 

Quando estendeu a mão para pegar o medalhão, ouviu uma voz atrás de si.

 

— Não faça isso, Pedro.

 

Virou-se e viu seu avô na entrada da caverna.

 

— Vovô? Como você me encontrou?

 

Joaquim caminhou lentamente em sua direção.

 

— Eu sabia que você não resistiria. Mas é preciso entender que esse objeto é perigoso.

 

Pedro olhou para o medalhão e depois para o avô.

 

— Mas podemos usar para o bem. Podemos ajudar nossa família.

 

Joaquim balançou a cabeça.

 

— O poder desse medalhão não distingue entre o bem e o mal. Ele consome quem o usa.

 

— Mas e se eu for forte o suficiente? — insistiu Pedro.

 

— Você não entende, Pedro. Foi esse mesmo pensamento que levou Antônio à ruína. Ele acreditava que poderia controlar o poder, mas acabou sendo controlado por ele.

 

Antes que pudesse impedir, Pedro agarrou o medalhão. Uma onda de energia percorreu seu corpo, a caverna começou a tremer.

 

— Pedro, solte-o agora! — gritou Joaquim.

 

Mas o garoto estava hipnotizado pelo poder que sentia. As paredes da caverna começaram a rachar, e as pedras caíram do teto. Joaquim correu em direção a Pedro, tentando tirar o medalhão de suas mãos.

 

— Não, vovô! Eu posso controlá-lo! — respondeu Pedro.

 

Uma luz intensa emanou do medalhão, cegando-os momentaneamente. Quando a luz se dissipou, a caverna ficou em silêncio. Joaquim olhou ao redor, mas Pedro havia desaparecido.

 

— Pedro! Onde você está? — chamou desesperado.

 

Sem resposta, Joaquim observa que o medalhão também havia sumido. Com o coração na mão, saiu da caverna, sentindo o peso da derrota. Sabia que o neto agora estava preso em algum lugar entre este mundo e o outro.

 

Nos dias seguintes, Joaquim se isolou, consumido pela culpa. Tentou encontrar uma maneira de trazer Pedro de volta, mas não sabia por onde começar. Uma noite, teve um sonho em que Antônio aparecia para ele.

 

— O ciclo se repete, Joaquim. O medalhão deve ser destruído — disse o ancestral.

 

— Como posso destruí-lo? — disse Joaquim.

 

— Contratar um guardiã da floresta. Ela sabe o que fazer — respondeu Antônio antes de desaparecer.

 

Determinado, Joaquim partiu em busca da guardiã da floresta, uma figura mítica que poucos acreditavam ser real. Adentrou pela floresta densa, enfrentando criaturas e obstáculos desconhecidos. Após dias de caminhada, chegou a uma clareira onde uma mulher de aparência etérea o aguardava.

 

— Eu sabia que você viria, Joaquim — disse ela, com uma voz suave.

 

— Preciso de sua ajuda para salvar meu neto — implorou ele.

 

A guardiã concordou.

 

— O medalhão é uma relíquia antiga, criada para testar a humanidade. Poucos resistem ao seu chamado.

 

— Como posso destruí-lo? — disse Joaquim.

 

— Há um ritual que pode quebrar a maldição, mas exige um sacrifício — explicou ela.

 

— Estou disposto a fazer qualquer coisa — afirmou.

 

A guardiã explicou que para destruir o medalhão e libertar Pedro, Joaquim teria que oferecer sua própria vida em troca.

 

— Você dará sua essência para salvar a dele — disse ela.

 

Sem hesitar, Joaquim concordou em se entregar pelo garoto.

 

— Pedro é jovem, tem toda a vida pela frente. Se este é o preço, estou disposto a pagá-lo.

 

A guardiã iniciou o ritual, entoando cânticos em uma língua ancestral. Uma luz suave envolveu Joaquim, que sentiu uma paz profunda.

 

— Cuide bem dele — foram suas últimas palavras.

 

Quando a luz se dissipou, Pedro apareceu na clareira, confuso.

 

— Vovô? — chamou, mas não obteve resposta.

 

A guardiã apareceu a ele.

 

— Seu avô se foi, mas seu amor por você permanece. Ele se sacrificou para que você pudesse viver.

 

Pedro caiu de joelhos, lágrimas escorrendo pelo rosto.

 

— Não! Vovô!

 

O guardiã colocou a mão no ombro.

 

— Lembre-se do que aconteceu aqui e faça escolhas sábias.

 

Retornando ao vilarejo, Pedro carregou o peso da culpa e da perda. Decidiu que honraria a memória do avô vivendo uma vida justa e ajudando os outros. Nunca contou a ninguém sobre o medalhão ou sobre o sacrifício de Joaquim.

 

Anos se passaram, e Pedro tornou-se um homem sábio, respeitado por todos. Dedicou-se a estudar as lendas e histórias da região, compartilhando conhecimento e alertando sobre os perigos da ambição desmedida.

 

Certa noite, enquanto observava as estrelas, ouviu um sussurro do vento.

 

— Estou orgulhoso de você — parecia dizer a voz do avô.

 

Pedro transmitiu, sentindo uma paz que há muito não experimentava.

 

O medalhão nunca mais foi visto, mas as lendas sobre ele persistiram, ocasionalmente como lembrete dos mistérios que o mundo guarda. E a árvore centenária continua a testemunhar as gerações que passam, guardando em suas raízes as histórias de amor, sacrifícios e redenção.

 

E assim, o ciclo foi quebrado, mas o bendito mistério, sussurrado pelo vento entre as folhas, esperando por aqueles que ousassem escutar, permanecia.

Prof Eduardo Nagai
Enviado por Prof Eduardo Nagai em 21/11/2024
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