Na correria constante da vida, onde os minutos pareciam escorregar entre meus dedos, eu vivia imerso em compromissos e responsabilidades. Mal amanhecia, e já estava de pé, pronto para enfrentar mais um dia. No entanto, por mais que tentasse controlar cada segundo, parecia que o tempo tinha vida própria, uma entidade invisível que eu mal conseguia acompanhar.
Lembrei-me de uma frase de Machado de Assis que li recentemente: "Matamos o tempo, o tempo nos enterra". Essas palavras ecoaram em minha mente enquanto eu observava as expressões cansadas das pessoas ao meu redor, todas presas em suas próprias batalhas contra o relógio. Ali, naquele instante, percebi que, na verdade, era o tempo que nos controlava.
No escritório, os ponteiros do relógio pareciam se mover mais rápido, um paradoxo cruel. Eu mal terminava uma tarefa, e outra já me esperava. Sentia-me como um funâmbulo em uma corda bamba, equilibrando-me entre prazos e metas. Matava o tempo com reuniões, relatórios e e-mails, mas, no fundo, sabia que cada momento desperdiçado era um passo mais próximo da inevitável realidade: o tempo também estava me matando.
Durante o almoço, enquanto olhava pela janela do restaurante, vi um grupo de crianças brincando no parque. Suas risadas ecoavam pelo ar, cheias de vida e despreocupação. Para elas, o tempo era um aliado, um amigo invisível que permitia que cada dia fosse uma nova aventura. Perguntei-me em que ponto da minha vida havia perdido essa percepção mágica do tempo.
Ao final do dia, exausto, retornei para casa. Sentei-me no sofá, sentindo o peso das horas acumuladas em meus ombros. Liguei a televisão, mas as imagens e sons não conseguiam preencher o vazio que sentia. Foi então que decidi sair para uma caminhada. Precisava respirar, pensar, tentar compreender aquela frase que tanto martelava minha mente.
Enquanto caminhava pelas ruas tranquilas do meu bairro aqui em São Carlos, a lua cheia iluminava meu caminho. Refletia sobre como havia permitido que o tempo se tornasse meu inimigo. Talvez, pensei, a chave fosse resgatar a criança interior, aquela que sabia aproveitar cada instante sem pressa, que via o mundo com olhos curiosos e coração aberto.
Cheguei a uma praça onde havia um banco. Sentei-me, observando o movimento das folhas ao vento e o brilho das estrelas no céu. Ali, naquele momento de paz, senti uma conexão com algo maior. Entendi que, embora o tempo fosse implacável, eu ainda tinha o poder de escolher como vivê-lo.
Decidi, então, que ao invés de matar o tempo, começaria a vivê-lo em cada vão momento. Passaria mais momentos com a família, retomaria hobbies esquecidos, dedicaria tempo às pequenas coisas que trazem alegria. Afinal, o tempo nos enterra, mas cabe a nós decidir o que faremos com os preciosos momentos que temos antes disso.
Levantei-me do banco com um novo propósito. Sabia que o relógio continuaria a girar, mas, a partir daquele dia, eu também giraria, não mais em círculos viciosos de afazeres intermináveis, mas em espirais de experiências significativas e memórias duradouras. A vida é um labirinto de memórias em que caminhávamos não sei para onde, não sei para quê. Porém, sabia naquele momento insólito: o importante era caminhar.